Ministra do Meio Ambiente deixa audiência após ofensas; Planalto diz que não sabia da ida dela à comissão.
A ida da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, à Comissão de Infraestrutura do Senado, nesta terça-feira (27), virou palco de um episódio constrangedor, marcado por ataques, ofensas e machismo explícito. Mais do que isso, escancarou uma fragilidade na articulação do governo: nem o Palácio do Planalto, nem parte da base governista sabiam da participação da ministra na audiência.
O episódio gerou desconforto até dentro do próprio governo. Integrantes do núcleo político afirmam que não foram avisados da agenda, que não constava no radar da Secretaria de Relações Institucionais, responsável por acompanhar e mobilizar apoios no Congresso.
O resultado foi uma audiência marcada por constrangimento, onde Marina se viu praticamente sozinha diante de uma sequência de ataques. Sem respaldo efetivo da base, foi interrompida, teve o microfone cortado e deixou a sessão antes do encerramento.
“O senhor gostaria que eu fosse uma mulher submissa. Eu não sou”, respondeu Marina após ser ironizada pelo senador Marcos Rogério (PL-RO), que presidia a sessão e mandou que ela “se colocasse no seu lugar”.
Poucos parlamentares saíram em sua defesa. Apenas o líder do PT, Rogério Carvalho (SE), e a senadora Eliziane Gama (PSD-MA) reagiram aos ataques durante a sessão.
Ataques machistas e constrangimento público
O clima azedou de vez quando o senador Plínio Valério (PSDB-AM) disparou:
“A mulher merece respeito. A ministra, não.”
Marina não deixou passar:
“Eu sou as duas coisas. O senhor está falando com as duas coisas.”
Ela também relembrou uma fala do próprio senador, feita meses antes, quando ele declarou publicamente que tinha vontade de “enforcá-la”.
Diante dos ataques, da condução truculenta da sessão e da ausência de apoio efetivo, Marina se levantou e deixou o plenário:
“Vocês me convidaram como ministra. Têm que me respeitar. Eu me retiro porque não fui convidada por ser mulher.”
Planalto surpreso, solidariedade depois
O Planalto se apressou a dizer que não foi informado oficialmente sobre a participação da ministra na comissão. Segundo ministros, nem o Congresso comunicou, nem o próprio Ministério do Meio Ambiente sinalizou a agenda.
A falta de articulação custou caro. Após o desgaste público, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a primeira-dama, Janja da Silva, ligaram para Marina para prestar solidariedade. O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), também telefonou, assim como outros ministros, que se manifestaram nas redes sociais.
Já Randolfe Rodrigues (PT-AP), líder do governo no Congresso, que tem histórico de divergências com Marina sobre pautas ambientais, não esteve na audiência. No entanto, horas depois, fez um discurso em defesa da ministra e condenou os ataques:
“O debate pode ser duro, mas desrespeito é inaceitável.”
Bancada Feminina reage
A Bancada Feminina do Senado também se manifestou de forma contundente. Em nota, repudiou os ataques, classificando-os como “misóginos e sexistas”, e destacou a violação do Regimento Interno do Senado, que assegura o direito à tréplica; negado à ministra.
“Ficou evidente que, naquela sessão, a última palavra precisava ser de um homem”, diz o texto, assinado pela líder da bancada, senadora Leila Barros (PDT-DF).
O que podemos esperar?
O episódio deixa não só feridas expostas na relação entre Marina e parte da base, mas também um alerta sobre os riscos de falhas na articulação do governo. E escancara, mais uma vez, como o machismo estrutural ainda se impõe de forma violenta nos espaços de poder.
Por: Daniela Castelo Branco
Foto: Divulgação