Confissão, arma de delegada e renúncia de advogado marcam caso que chocou Minas e expõe violência cotidiana no trânsito.
A morte do gari Laudemir de Souza Fernandes, em Belo Horizonte, continua a ganhar novos desdobramentos e escancara o quanto a violência pode atravessar situações banais do dia a dia. O crime aconteceu no dia 11 de agosto, após uma discussão de trânsito, e foi cometido pelo empresário Renê da Silva Nogueira Junior, que nesta segunda-feira (18) mudou a versão que havia dado à polícia e confessou a autoria do disparo.
No novo depoimento, prestado no Departamento Estadual de Investigação de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), Renê admitiu que usou a pistola calibre .380 de sua esposa, a delegada da Polícia Civil Ana Paula Balbino Nogueira, para atirar contra Laudemir. Ele alegou que a companheira não sabia que a arma havia sido retirada de casa para a prática do crime.
Logo após os disparos, câmeras de segurança flagraram o empresário entrando em seu prédio, manuseando a arma e guardando-a em uma mochila. Horas mais tarde, ele foi localizado pela polícia enquanto treinava em uma academia. No dia da prisão, havia negado qualquer envolvimento no homicídio.
A perícia confirmou que o projétil que matou o gari partiu da arma registrada no nome da delegada, que voluntariamente entregou o armamento às autoridades e declarou desconhecer o crime. Ainda assim, a Corregedoria-Geral da Polícia Civil instaurou procedimento disciplinar e um inquérito para apurar sua conduta.
Defesa abandona o caso
Nesta semana, o advogado de Renê, Leandro Guimarães Salles, anunciou que não continuará na defesa do empresário, alegando “foro íntimo”. A renúncia não paralisa o processo, já que, por lei, todo acusado deve ter representação legal. Caso Renê não apresente um novo advogado no prazo definido, a Justiça poderá nomear um defensor público.
O empresário segue preso preventivamente. A decisão judicial destacou a “extrema gravidade concreta dos fatos” e a “periculosidade social do agente”, lembrando que Renê já responde a outro processo por lesão corporal grave em São Paulo, no contexto de violência doméstica.
Crime qualificado e rotina de violência
O assassinato foi enquadrado como homicídio duplamente qualificado, por motivo fútil e por dificultar a defesa da vítima, além de ameaça à motorista do caminhão de lixo que testemunhou a cena. O juiz responsável pelo caso chegou a questionar em sua decisão a frieza do empresário: “Comete um crime desse porte, desse nível, e vai treinar numa academia?”.
O caso segue sob investigação da Polícia Civil, e a expectativa é de que, com a conclusão do inquérito, o Ministério Público apresente denúncia formal contra Renê.
Enquanto isso, a morte de Laudemir se soma a uma dolorosa lista de vítimas da intolerância e da violência cotidiana no trânsito brasileiro: um alerta de como pequenas discussões podem escalar para tragédias irreversíveis.
Texto: Daniela Castelo Branco
Foto: Divulgação
Reportagem: CNN Brasil