Análise técnica do PLDO de 2026 também alerta para riscos fiscais subestimados, como decisões judiciais e violação da regra de ouro.
O aumento real do salário mínimo previsto para 2026 pode custar R$ 84,1 bilhões aos cofres públicos, segundo análise das consultorias de orçamento da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Os dados fazem parte de um parecer técnico sobre o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026, divulgado nesta terça-feira (27).
O cálculo leva em conta a reposição da inflação, medida pelo INPC, e um ganho real vinculado ao crescimento do PIB de 2024. Se confirmado, o salário mínimo deve subir dos atuais R$ 1.518 para R$ 1.630 em 2026, um aumento de R$ 112.
A análise técnica detalha que, do impacto total, R$ 16,8 bilhões vêm do aumento real dos benefícios vinculados ao mínimo e outros R$ 67,3 bilhões são resultado da correção pela inflação, aplicada tanto a benefícios equivalentes quanto aos superiores ao piso nacional.
Mais riscos no horizonte
O parecer das consultorias também acende alerta para outros riscos fiscais que, segundo os técnicos, estão subestimados nas projeções do governo. Um dos principais pontos é o tamanho dos passivos judiciais da União, que são ações na Justiça que podem gerar despesas bilionárias, caso tenham decisão desfavorável ao governo.
De acordo com o levantamento, apenas em 2024, as ações classificadas como de risco possível somam R$ 2,1 trilhões. Já aquelas consideradas de risco provável, nas quais as chances de derrota são maiores, chegam a R$ 559,1 bilhões: ainda que ambos os valores tenham apresentado queda em relação a 2023.
Outro ponto crítico destacado é que o próprio PLDO admite a possibilidade de violar a chamada “regra de ouro”, princípio constitucional que impede o governo de se endividar para pagar despesas correntes, como salários e benefícios, sem autorização do Congresso.
Na prática, o texto permite que o governo contrate empréstimos acima do limite da regra de ouro, desde que o Congresso aprove posteriormente um crédito adicional. As margens negativas projetadas com essa flexibilização chegam a R$ 269,7 bilhões em 2026 e R$ 399,8 bilhões em 2027.
Superávit ou déficit?
Apesar da meta fiscal do governo central prever um superávit de R$ 34,26 bilhões (0,25% do PIB), o próprio PLDO aponta a possibilidade de déficit primário de R$ 16,9 bilhões, dentro de uma margem de tolerância que permite até zerar o resultado sem que isso configure descumprimento da meta.
Considerando cenários mais otimistas, sem pagamento extra de precatórios, o governo poderia chegar a um superávit de R$ 38,2 bilhões (0,28% do PIB), mas ainda assim é uma projeção apertada diante das despesas previstas e dos riscos identificados.
Insegurança jurídica e falta de transparência
Além dos problemas fiscais, o parecer das consultorias alerta para riscos de insegurança jurídica e falta de transparência. Um dos pontos mais sensíveis é a possibilidade de o Ministério do Planejamento alterar, por ato próprio, o Anexo V da Lei Orçamentária, que trata da programação de cargos e salários no serviço público.
Segundo os técnicos, essa autorização contraria a Constituição, que exige autorização expressa do Congresso para mudanças desse tipo. Na prática, isso pode abrir brecha para questionamentos judiciais e enfraquece o controle legislativo sobre o orçamento de pessoal.
O texto também critica a ausência de mecanismos claros para a divulgação de gastos relacionados a calamidades públicas e refinanciamento da dívida pública federal, o que compromete a transparência das contas.
No caso das estatais, outro ponto de atenção é a possibilidade de empresas dependentes da União serem incluídas no orçamento de investimentos se tiverem contrato de gestão. Para os especialistas, isso reduz o controle social e fiscal sobre o uso de dinheiro público, além de abrir margem para despesas fora do radar tradicional do orçamento.
Pressão crescente sobre as contas públicas
O parecer das consultorias funciona como um alerta: a combinação de aumento de despesas obrigatórias, riscos judiciais bilionários, margem fiscal estreita e regras sendo flexibilizadas pode colocar pressão crescente sobre as contas públicas nos próximos anos.
Diante desse cenário, a gestão fiscal do país deve enfrentar desafios ainda maiores para equilibrar as contas, cumprir metas e, ao mesmo tempo, atender às demandas sociais e econômicas.
Por: Daniela Castelo Branco
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