Em meio à pressão das tarifas americanas, Pequim abre espaço para produtos brasileiros, mas adaptação exige estratégia, presença e sensibilidade cultural.
Imagine trabalhar duro durante anos, conquistar clientes fiéis e, de repente, receber a notícia de que vender para um dos seus maiores mercados ficou 50% mais caro. É exatamente o que muitos exportadores brasileiros estão vivendo após o tarifaço dos Estados Unidos, que atingiu em cheio produtos nacionais desde 6 de agosto. Mas no horizonte surge um novo farol: a China, que já é nosso maior parceiro comercial e agora acena com oportunidades inéditas.
O momento não é coincidência. Analistas como Thomas Law, presidente do Ibrachina, afirmam que Pequim tem seguido uma estratégia clara: reduzir a dependência de fornecedores únicos e fortalecer laços com países de confiança, como o Brasil. A consequência? Produtos que antes eram comprados dos EUA passam a ser buscados aqui: especialmente em alimentos, energia, commodities e insumos industriais.
O desafio, no entanto, é que as exportações brasileiras para cada país são muito diferentes. Para a China, vendemos principalmente commodities e produtos do agronegócio. Para os EUA, o peso está nos manufaturados e bens de valor agregado. Ou seja: não é só empacotar o que iria para a América e mandar para a Ásia.
Ainda assim, sinais concretos de aproximação não param de surgir. Pequim habilitou 183 novas empresas brasileiras para fornecer café, quase dobrou o número de exportadores de gergelim (de 31 para 61) e liberou 41 fornecedores de farinha animal. Para especialistas como Daniel Lau, essa é uma janela real de reposicionamento no mercado chinês; e ela está aberta agora.
Além dos produtos agrícolas, setores como semicondutores, sucos, sorvetes, logística, energias renováveis, combustível sustentável para aviação (SAF) e até medicina já estão no radar chinês. Estados como o Ceará se movimentam: o governador Elmano de Freitas se reuniu com o embaixador Zhu Qingqiao para discutir parcerias econômicas.
Mas atenção: entrar e prosperar na China não é “apertar um botão”. O mercado chinês exige mais que bons produtos. É preciso compreender seu sistema político, econômico e cultural. Lá, negócios são baseados em confiança, relacionamentos duradouros e respeito mútuo: o famoso Guanxi. Isso significa estar presente fisicamente, visitar o país, participar de feiras como a Canton Fair, entender exigências sanitárias, registrar marcas e patentes, e adaptar embalagens e rótulos.
Programas como o Exporta Mais Brasil, da Apex, podem ajudar. O governo Lula já fala em ampliar medidas de apoio. Mas a mudança de mentalidade é urgente: o tarifaço americano não tem volta, e depender de um só mercado é um risco enorme.
Como resume Fagner Santos, da JF Comex Consultoria: “É hora de agir. Pequenas e médias empresas também precisam aproveitar esse momento. Quem já foi, voltou com resultados. Oportunidade existe, mas é para quem chega cedo e chega preparado.”
Texto: Daniela Castelo Branco
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