Ao validar decreto de aumento do imposto, Moraes atende governo, irrita oposição e acende alerta sobre caráter arrecadatório da medida.
A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de restabelecer a validade do decreto que aumentou as alíquotas do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) gerou forte repercussão política e econômica nesta quarta-feira (17). De um lado, o governo celebrou o que considerou uma vitória institucional. De outro, a oposição acusou o STF de atropelar o Congresso e alimentar um modelo de “autoritarismo fiscal”.
O decreto restabelecido dobra o IOF diário em operações de crédito para empresas de todos os portes, inclusive microempreendedores individuais (MEIs), além de incidir sobre câmbio e investimentos em VGBL. A cobrança, inclusive, terá efeito retroativo; o que ampliou ainda mais as críticas do setor produtivo.
Mercado vê desvio de finalidade
Para analistas do mercado financeiro, a decisão abre um precedente perigoso ao admitir o uso do IOF como ferramenta arrecadatória, em vez de regulatória: sua finalidade original. A preocupação é que o imposto seja transformado em um mecanismo para cobrir rombos no orçamento, penalizando tomadores de crédito, especialmente os pequenos negócios que já enfrentam dificuldades com taxas elevadas e insegurança jurídica.
Um relatório recente do Tesouro Nacional, inclusive, revelou que sem essa receita extra o governo teria dificuldade em alcançar a meta fiscal de 2025. O dado, por si só, reforça a percepção de que a medida tem viés arrecadatório, apesar do discurso oficial contrário.
Risco sacado fica fora
A única exceção admitida por Moraes foi em relação ao chamado “risco sacado”: modalidade usada por varejistas para antecipar recebíveis junto a fornecedores. O ministro entendeu que o governo extrapolou os limites legais ao tentar tributar esse tipo de operação como se fosse crédito. Segundo ele, houve “excesso normativo”.
Conflito entre poderes e crítica da oposição
A decisão veio um dia após a audiência de conciliação entre Executivo e Legislativo no STF, que terminou sem acordo. O advogado-geral da União, Jorge Messias, afirmou que o encontro não se restringiu ao debate sobre o imposto. “Nós fomos ao Supremo para defender o princípio da separação de poderes”, disse à CNN.
Na prática, porém, a restauração do decreto foi interpretada por parlamentares da oposição como um desprezo à decisão soberana do Congresso, que havia derrubado a medida por ampla maioria. O líder da oposição na Câmara, deputado Coronel Zucco (PL-RS), chamou o episódio de “vergonhoso” e “autoritário”. Para ele, o Brasil está “refém de uma aliança entre governo e STF que ignora os freios e contrapesos da República”.
Governo celebra e fala em vitória institucional
Na outra ponta, o governo comemorou. A AGU classificou a decisão como um “marco constitucional” e defendeu que o Supremo agiu com equilíbrio. “O princípio da separação de poderes foi respeitado, com atribuições e limites claramente definidos”, disse Messias em nota. Já o Ministério da Fazenda afirmou que a medida ajuda a “restabelecer a harmonia entre os poderes” e garante segurança jurídica para a política econômica do Executivo.
Agora, com o decreto restaurado, a cobrança mais pesada do IOF passa a valer imediatamente, exceto no caso do “risco sacado”, excluído por inconstitucionalidade. O impasse, no entanto, está longe de ser encerrado. No Congresso, a insatisfação continua fervendo. E no mercado, os sinais de alerta seguem ligados.
Texto: Daniela Castelo Branco
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