Ministro do STF vê “ilegalidade grave” em retroativos liberados pelo TJ-RO e cobra transparência do CNJ
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, determinou nesta quarta-feira (25) que a Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ) tome providências sobre pagamentos milionários autorizados pelo Tribunal de Justiça de Rondônia (TJ-RO) a magistrados aposentados. A decisão envolve benefícios retroativos, os chamados “penduricalhos”, que elevaram a remuneração de alguns juízes muito além do teto constitucional.
Na decisão, Dino classificou o caso como “grave” e questionou a falta de critérios uniformes nos valores pagos. Segundo ele, “não parece ter base constitucional a continuidade de procedimentos díspares em pagamento de ‘retroativos’ por tribunais do país”.
A manifestação do ministro responde a uma ação movida por juízes aposentados que denunciaram desigualdade nos descontos aplicados aos pagamentos retroativos do Adicional por Tempo de Serviço (ATS). Enquanto alguns receberam valores praticamente integrais, outros sofreram cortes de até 90%, sem justificativa clara.
Milionários de toga em um dos estados mais pobres
O caso ganha ainda mais repercussão diante do histórico de supersalários no Judiciário de Rondônia. Reportagens revelaram que só em fevereiro de 2024, o TJ-RO pagou 27 salários acima de R$ 1 milhão. Em outubro, mais um pagamento milionário foi registrado. Em 2023, o tribunal teve a maior média de rendimento bruto mensal entre os tribunais estaduais: R$ 126,5 mil por magistrado.
Esse cenário contrasta com a realidade econômica de Rondônia, estado que figura entre os mais pobres do país e com baixo PIB per capita. Para o ministro, decisões como essa ferem o princípio da isonomia e reforçam distorções dentro do próprio Judiciário.
O que são os penduricalhos?
Os chamados “penduricalhos” são benefícios pagos à margem do teto constitucional, sob a justificativa de possuírem caráter indenizatório. Criados a partir da Emenda Constitucional 47/2005, eles escapam da limitação salarial ao não serem considerados remuneração direta. A brecha permitiu a criação de uma série de adicionais, como:
- Gratificações por tempo de serviço;
- Férias e licenças não usufruídas;
- Abonos, auxílios e bonificações diversas.
Na prática, esses benefícios inflam os contracheques de juízes e membros do Ministério Público, muitas vezes ultrapassando com folga o teto atual do funcionalismo público, de R$ 46.366,19 (reajustado em março de 2025).
STF cobra padronização e transparência
Na decisão, Dino também fez uma crítica à fragmentação administrativa do Judiciário, destacando que não podem existir “ilhas” que contrariem o que é decidido pelo STF e pelo CNJ. “O Poder Judiciário é nacional e não podem existir decisões à revelia da Constituição e da Lei Orgânica da Magistratura”, escreveu.
Para instruir a investigação, o ministro solicitou à Corregedoria a apresentação dos contracheques mensais dos beneficiados, desde dezembro de 2022, além de demonstrativos individuais do ATS e outros documentos considerados essenciais.
A iniciativa de Flávio Dino reforça o debate sobre a urgência de maior controle, isonomia e transparência nos pagamentos feitos pelo Judiciário, especialmente em um momento em que o combate aos privilégios se torna uma pauta cada vez mais presente na sociedade e no Congresso Nacional.
Texto: Daniela Castelo Branco
Foto: Divulgação/STF