Ex-comandante da Marinha foi ouvido pelo STF e disse que não houve discussão de golpe; ele também justificou como “coincidência” o desfile de blindados em dia de votação do voto impresso
O ex-comandante da Marinha, Almir Garnier, foi ouvido nesta terça-feira (10) pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no inquérito que apura uma suposta tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. Durante o interrogatório, ele confirmou ter participado de uma reunião com o então presidente Jair Bolsonaro (PL), mas negou qualquer articulação golpista ou apresentação de uma “minuta do golpe”.
“Houve a apresentação de alguns tópicos de considerações que poderiam levar, talvez – não foi decidido isso naquele dia –, à decretação de uma GLO ou de necessidades adicionais visando a segurança pública”, declarou Garnier, referindo-se à Garantia da Lei e da Ordem, dispositivo constitucional que autoriza o uso das Forças Armadas em casos de desordem pública.
Segundo ele, não houve distribuição de documentos ou proposta formal durante o encontro. “Quando você fala em minuta, eu penso em documento, em papel que é entregue. Eu não recebi esse tipo de documento. Houve apenas uma apresentação na tela de um computador”, afirmou.
O almirante é um dos oito réus ouvidos nesta semana pelo STF. Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), ele foi o único comandante das Forças Armadas a demonstrar apoio ao plano de golpe. Essa versão, porém, é contestada. Enquanto o ex-comandante da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Júnior, afirmou que Garnier teria colocado tropas à disposição de Bolsonaro, o ex-chefe do Exército, Freire Gomes, negou ter interpretado esse gesto como conluio.
Desfile de blindados foi “coincidência”, diz almirante
Outro ponto abordado no depoimento foi o desfile de blindados realizado pela Marinha em agosto de 2021, na Esplanada dos Ministérios, no mesmo dia em que a Câmara dos Deputados votava a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do voto impresso; uma pauta fortemente defendida por Bolsonaro.
Garnier negou que a ação tivesse objetivo de intimidar o Congresso. “Foi uma coincidência. A Câmara alterou a data da votação com quatro dias de antecedência, e eu não teria como mudar toda a logística de transporte dos blindados”, justificou. Segundo ele, o desfile fazia parte de uma operação militar que acontece anualmente em Formosa (GO), planejada com grande antecedência, e a exposição dos veículos foi pensada como uma “visitação pública”.
A presença de Bolsonaro no evento, porém, foi interpretada na época como uma tentativa de pressionar os deputados a aprovarem a PEC, que acabou rejeitada.
Julgamento segue no STF
Garnier foi o terceiro a prestar depoimento ao Supremo. Na segunda-feira (9), Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, afirmou que o ex-presidente recebeu, editou e manteve em sua posse uma minuta de decreto golpista. O segundo depoente foi o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Abin, que negou qualquer investigação paralela sobre o sistema eleitoral.
Além de Garnier, ainda devem ser ouvidos nos próximos dias:
• Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;
• Augusto Heleno, ex-ministro do GSI;
• Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
• Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
• Walter Braga Netto, ex-ministro e ex-candidato a vice na chapa de Bolsonaro.
As oitivas devem continuar ao longo da semana e são consideradas estratégicas para a formação do juízo do STF sobre os indiciamentos.
Texto: Daniela Castelo Branco
Foto: Divulgação