Corte retoma julgamento que pode mudar as regras da internet no Brasil e definir limites legais para redes sociais e empresas de tecnologia.
O Supremo Tribunal Federal (STF) entrou em uma fase decisiva para definir o futuro da internet no Brasil. Nesta quinta-feira (12), os ministros retomam o julgamento que pode mudar a forma como grandes plataformas digitais, como Google, Meta e X (ex-Twitter), são responsabilizadas por conteúdos ilegais publicados por usuários.
Na sessão de quarta-feira (11), o placar já apontava maioria: seis ministros votaram a favor da responsabilização das empresas, mesmo em casos sem ordem judicial. No entanto, o julgamento ainda não foi concluído porque falta a definição da tese final, que é o resumo da decisão que orientará a aplicação prática da nova regra no Judiciário.
Os votos têm pontos em comum, mas também divergências relevantes. Por isso, mesmo com maioria formada, o debate deve se estender por mais tempo.
O que está em jogo
Hoje, as regras para o funcionamento da internet no país são guiadas pelo Marco Civil da Internet, em vigor desde 2014. Pelo artigo 19 da lei, as plataformas só podem ser responsabilizadas se ignorarem uma ordem judicial que determine a remoção de conteúdo.
O STF está analisando se esse dispositivo é ou não constitucional. O julgamento tem repercussão geral, ou seja, o que for decidido valerá para todos os casos semelhantes na Justiça.
Dois casos concretos motivaram a discussão:
• Um deles envolve o Facebook, que questiona uma decisão da Justiça de São Paulo que determinou a remoção de um perfil falso.
• O outro é um processo contra o Google, obrigado a pagar danos morais por manter uma comunidade ofensiva contra uma professora no extinto Orkut.
Como votaram os ministros
• Dias Toffoli: Relator de um dos casos, considerou o modelo atual inconstitucional por dar “imunidade” às plataformas. Defendeu que, em casos graves, elas retirem conteúdos do ar mesmo sem notificação judicial.
• Luiz Fux: Também relator, votou para que empresas sejam obrigadas a remover conteúdos ofensivos assim que notificadas. Para ele, discursos de ódio, racismo e apologia ao golpe devem ser derrubados de forma imediata, sem esperar decisão judicial.
• Flávio Dino: Defendeu que as big techs sejam responsabilizadas não só quando notificadas, mas também em casos de falhas sistêmicas, como conteúdos que envolvam crimes contra crianças ou apologia ao terrorismo.
• Cristiano Zanin: Considerou o artigo 19 parcialmente inconstitucional. Para ele, só plataformas consideradas neutras, ou seja, que não impulsionam conteúdos, devem seguir a regra atual.
• Gilmar Mendes: Afirmou que o artigo 19 já foi importante, mas hoje está ultrapassado. Defendeu que as plataformas sejam responsabilizadas se forem notificadas sobre conteúdos ilícitos e não agirem.
• Luís Roberto Barroso: Apontou que o Marco Civil, como está, não garante proteção suficiente a direitos fundamentais. Defendeu a retirada imediata de conteúdos que representem crimes.
• André Mendonça, por outro lado, foi o único a defender o modelo atual. Para ele, só há responsabilidade se houver descumprimento de ordem judicial. Seu voto é alinhado à posição das big techs, que resistem a qualquer mudança na legislação.
O que vem pela frente
Nesta quinta-feira, os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Nunes Marques e Cármen Lúcia devem apresentar seus votos. Mesmo assim, a conclusão do julgamento não deve sair nesta semana.
Segundo o presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, nesta fase o STF está apenas colhendo as teses individuais dos ministros. As divergências entre elas serão discutidas em uma etapa posterior, para que se chegue a um texto final coeso.
A decisão do STF promete mexer profundamente com o ambiente digital no país. O equilíbrio entre liberdade de expressão, dever de proteção e responsabilidade das plataformas está no centro do debate; que ainda promete capítulos intensos nas próximas sessões.
Texto: Daniela Castelo Branco
Foto: Felipe Sampaio/STF