Decisão que derruba as regras das “sobras das sobras” eleitorais reforça jurisprudência, fecha brechas jurídicas e tem impacto direto na representação política em Rondônia
O Supremo Tribunal Federal (STF) deu mais um passo importante na consolidação das regras sobre o sistema eleitoral brasileiro. Em decisão publicada nesta segunda-feira, 16 de junho de 2025, o ministro Flávio Dino rejeitou os segundos embargos de declaração apresentados na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.263, que questionava pontos do Código Eleitoral e da resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a distribuição das chamadas “sobras das sobras” eleitorais.
Com a decisão, o ex-vereador de Ariquemes, Rafael Fera (Podemos), fica mais próximo de assumir uma cadeira na Câmara dos Deputados, em Brasília, no lugar de Eurípedes Lebrão (União Brasil), que é um dos atingidos pela mudança.
Agora, a posse de Fera depende apenas de um ato administrativo do presidente da Câmara, Hugo Motta, que deve oficializar a substituição nos próximos dias.
Entenda o caso
O julgamento envolve três ações (ADIs 7.228, 7.263 e 7.325), movidas por partidos como Podemos, PSB, Rede Sustentabilidade e Progressistas. Todas questionavam a constitucionalidade de dispositivos alterados pela Lei nº 14.211/2021 e pela resolução TSE nº 23.677/2021, que tratavam da forma de distribuição das vagas remanescentes nas eleições proporcionais – as chamadas “sobras eleitorais”.
Essas regras definiam, na prática, como os partidos e coligações poderiam disputar as vagas que sobravam após a primeira rodada de cálculo pelo quociente eleitoral. As legendas envolvidas alegavam que o sistema favorecia partidos com menos votos e criava distorções na representatividade.
As três ações tramitaram em conjunto no STF, todas sob relatoria de Flávio Dino, que desde o início indicava a inconstitucionalidade dos dispositivos questionados.
O que disseram os embargantes?
Após a decisão inicial que declarou inconstitucionais as regras sobre as sobras, os partidos e os advogados da Câmara dos Deputados apresentaram embargos de declaração, pedindo uma nova análise sobre a modulação dos efeitos da decisão – ou seja, se a mudança teria validade imediata ou apenas a partir das próximas eleições.
Além disso, levantaram a tese de que a decisão do STF estaria violando a coisa julgada formada em uma das ações (a ADI 7.325), que já havia transitado em julgado antes das demais.
Mas o ministro Flávio Dino foi categórico ao rejeitar os argumentos. Segundo ele, os advogados da Câmara não tinham legitimidade para apresentar recursos, já que, em casos de controle concentrado de constitucionalidade, apenas as Mesas da Câmara e do Senado, por meio de seus presidentes, têm essa prerrogativa. Como os recursos foram assinados apenas por procuradores da Câmara, sem a chancela do presidente da Casa, houve ilegitimidade processual.
Da mesma forma, Dino descartou os recursos apresentados pelos partidos Republicanos e Progressistas, que participaram da ação apenas como amici curiae – figura jurídica que permite a terceiros apenas fornecerem informações técnicas, mas sem direito a recorrer.
Decisão com efeito imediato
No mérito, o ministro reforçou que a decisão do STF não violou a coisa julgada e que o que houve foi apenas a correção de um erro material na proclamação dos efeitos da decisão inicial, sem alteração no conteúdo.
Dino também destacou que, no âmbito das ações diretas de inconstitucionalidade, a coisa julgada não é “imutável” como nos processos individuais. O Supremo tem o poder de modular os efeitos de suas próprias decisões, inclusive de forma retroativa ou prospectiva, de acordo com o impacto social e jurídico.
Além de rejeitar os recursos, o ministro determinou a certificação imediata do trânsito em julgado da decisão; o que, na prática, reforça a ordem para que a Câmara dos Deputados dê posse aos novos parlamentares conforme a redistribuição das vagas.
Repercussão política
A decisão gerou grande repercussão em Rondônia, especialmente entre os apoiadores de Rafael Fera, que aguardam a oficialização de sua posse em Brasília. Fera, que foi vereador em Ariquemes, deve reforçar a bancada de Rondônia na Câmara com um perfil de oposição ao atual governo estadual.
Nas redes sociais, o tema também dominou os debates. No Twitter/X, a hashtag #SobrasEleitorais chegou a figurar entre os assuntos mais comentados, com juristas, políticos e analistas políticos discutindo os desdobramentos.
O portal jurídico ConJur classificou a decisão como um marco na jurisprudência sobre a flexibilidade da coisa julgada em ações de controle concentrado. Especialistas também apontam que a medida pode influenciar as estratégias dos partidos já nas eleições de 2026, forçando legendas a recalcular suas coligações e formas de disputa para evitar perder cadeiras na divisão de sobras.
O que vem a seguir?
Com a decisão consolidada e o trânsito em julgado determinado, o próximo passo é a Câmara dos Deputados formalizar a substituição. Até lá, o cenário político em Rondônia segue em expectativa. A decisão do STF não apenas impacta a composição atual da Câmara, mas também sinaliza para o futuro: as regras eleitorais continuarão sob o crivo rigoroso da Corte, que tem demonstrado tolerância zero com manobras jurídicas que possam burlar os princípios constitucionais de representatividade e proporcionalidade.
Texto: Daniela Castelo Branco
Foto: Divulgação